TRANSVERSO DO ABDOME: ANATOMIA E FUNÇÃO

ANATOMIA DA REGIÃO TÓRACO-LOMBAR

Segundo Platzer  a fáscia tóraco lombar (Fig 1) envolve a musculatura paravertebral  e é composta por dois folhetos : um superficial e um profundo.

Fig. 1

1. fascia toraco-lombar
2. m. paravertebrais
3. folheto superficial
5. m. serrátil póstero-inf
8. folheto profundo
9. ap. costiforme

10 m. obliquo interno
11. m. transv. abdom.

  1. O superficial se une firmemente na região sacral à massa comum dos para vertebrais. Mais acima se afina e dá origem ao Grande dorsal (Latissimus dorsi) e ao Serrátil póstero inferior. Na imagem da Fig 2 (Platzer) vemos o espesso folheto fascial lombar recortado de forma a nos mostrar sua continuidade com o corpo do músculo Grande Dorsal, corpo este também recortado em sua porção medial para visualizarmos o Serratil póstero-inferior  situado em plano mais interno e ligado ao bordo do mesmo folheto lombar que dá origem ao seu invólucro. Portanto, esse folheto superficial dá origem ao invólucro do Grande Dorsal e do Serrátil póstero-inferior.

Fig. 2

3. Fáscia toraco-lombar folheto  superficial
4. m. grande dorsal
5. m. serrátil post. inf.
6. m. trapézio
7. aponeurose superficial da nuca
12. m. serrátil post. sup.

 

Este folheto superficial da fáscia tóraco-lombar se continua para a região cervical, onde também é bastante fino e separa o músculo esplênio do pescoço e da cabeça do músculo trapézio e romboide Acima do romboide se confunde com a aponeurose superficial do pescoço.

2. O profundo que se destaca das apófises costiformes lombares (que indevidamente chamamos de transversas) e separa a        musculatura paravertebral dos músculos da parede antero-lateral do tronco (psoas maior de quadrado lombar) Fig 1. Deste folheto profundo, que se estende até a crista ilíaca, se originam o músculo oblíquo interno do abdome e o transverso do abdome.

Fig 3

Rouvière esclarece que o Obliquo interno do abdome liga-se às fibras da aponeurose lombar profunda que se inserem na transversa da 5ª vértebra lombar. O transverso ocupa toda a extensão da fáscia entre a caixa torácica e o ilíaco (rafe lateral). Descreve também um reforço à essa lâmina fascial: uma série de ligamentos que se irradiam de cada apófise costiforme lombar para a face posterior da aponeurose do Transverso. Os da primeira e segunda vértebras lombares são especialmente resistentes e são conhecidos como ligamentos de Henle  Fig 3   (Rouvière)

Nessa imagem também podemos observar uma área frágil na qual pode se produzir herniações. Conhecida como Triângulo lombar superior ou de Grynfeltt , é delimitada pelo bordo inferior da 12ª costela superiormente, pelo bordo superior do músculo Oblíquo interno e pelo bordo lateral da massa dos paravertebrais .  Aqui, o músculo Transverso do abdome está recoberto apenas pela aponeurose do Grande dorsal

 

Na fig 4, (Rouvière),  ao lado, podemos entender como o folheto superficial da aponeurose lombar envolve o Grande Dorsal, o Serrátil póstero-inferior e prolonga-se para a região cervical recobrindo as costelas, passando por baixo dos romboides. Acima deles ele se prolonga (ou se transforma ) na fáscia superficial da nuca (fig 2).

 

 

 

 

 

 

ANATOMIA DO MÚSCULO TRANSVERSO ABDOMINAL

Inserções

Fig. 5 (Netter)

Inserções posteriores: nas apófises costiformes das vértebras lombares através da fáscia tóraco-lombar, esquematizadas na fig 1.

 

 

 

 

 

 

Fig. 6 (Netter)

Inserções costais: na região interna das seis cartilagens costais inferiores onde se                       interligam com as inserções do diafragma formando um entrecruzamento de cestaria com as fibras do diafragma.

 

 

 

 

 

 

Fig. 7 (Netter)

Inserções no ligamento inguinal:   terço lateral do ligamento

 

 

 

 

 

Fig. 8 (Rouvière)

Inserções crista ilíaca: Na ampliação da imagem que esquematiza as inserções musculares na crista ilíaca vemos que a linha correspondente ao m. transverso abdominal ocupa os dois terços anteriores do lábio interno da crista.

 

 

Trajeto:

A porção que se insere no terço externo do ligamento inguinal corre ínfero-medialmente, mistura-se com as fibras do obliquo interno, de mesmo sentido (fig 7), forma com ele um tendão comum  que insere-se na região do púbis. As demais fibras correm medialmente em direção à linha alba.

Divisão em três porções (3):

As fibras da região ventral superior : inserem-se nos bordos das cartilagens costais, têm uma orientação mais transversal, mas são mais curtas e finas que em outras regiões do músculo.

As fibras situadas entre a caixa torácica e crista ilíaca: são as únicas com inserção direta na fáscia tóraco-lombar. São levemente inferomediais e apresentam comprimento maior.

As fibras inferiores da crista ilíaca e ligamento inguinal, já descritas, são as mais espessas.

Formação da linha alba

Fig 9 (Kapandji)

Alguns centímetros abaixo do umbigo encontra-se a linha arqueada. É o local onde o músculo reto do abdome passa para a região posterior do músculo transverso.

 

 

 

 

 

 

Fig 10 (Platzer)

9.m.transv do abdome
5. m. obl interno
8. m. obl externo
1. m. reto do abdome
10. linha alba
12. fáscia transversalis

 

 

Acima da linha arqueada a fáscia de revestimento do músculo oblíquo interno se abre em duas lâminas (anterior e posterior) e abraça o músculo reto do abdome formando sua fáscia. A lâmina anterior é reforçada pela fáscia de revestimento do oblíquo externo. A lâmina posterior é reforçada pela fáscia de revestimento transverso do abdome. Todas as fáscias se encontram na linha alba que se estende do esterno ao púbis  e parte das fibras se entrecruzam de forma a colocar parte das fibras da aponeurose do oblíquo externo de um lado em contato com as do oblíquo interno do lado oposto. (Fig 10B)

Abaixo da linha arqueada as fáscias de revestimento dos três músculos passam à frente do músculo reto do abdome. Todas têm o mesmo sentido ínfero-medial e têm o objetivo de sustentar os órgãos da pelve maior (Fig 10C).

 

FISIOLOGIA DO MÚSCULO TRANSVERSO ABDOMINAL

Muitos autores discutem seu papel na estabilização lombar. Hodges (3) em seu livro Fisioterapia para a estabilização lombo-pélvica afirma que o músculo pode atingir esse objetivo em particular através de:

– modulação da pressão intra-abdominal

– modulação da tensão fascial

– compressão das articulações sacro-ilíacas

Modulação da pressão intra-abdominal

Na vida real quando há aumento da pressão intra-abdominal (levantamento de peso, corrida, caminhada), as contrações do Transverso abdominal, Diafragma e músculos do assoalho pélvico não ocorrem isoladas, mas concomitantemente. No entanto, em trabalho publicado em 1992 por Cresswell  (6) e colaboradores encontramos que a  atividade do Transverso era a única que se mantinha sempre presente em todos os movimentos da coluna (incluindo extensão), com e sem manobras de Valsava associadas. A conclusão é de que se trata do músculo que mais consistentemente se relaciona com as alterações de pressão intra-abdominal.

Modulação da Tensão Fascial

Fig 11 (Hodges)

Por se inserir ao longo de toda a porção lateral da fáscia tóraco-lombar a contração do transverso abdominal aumenta a tensão nas camadas intermediária e posterior da desta.  Além disso, aumentaria também o torque extensor da coluna lombar devido à obliquidade das  fibras constituintes da fáscia(7).

 

 

Fig 12 (Hodges)

a. Folheto profundo da fáscia lombar sem contração do transverso abdominalb O mesmo folheto pós contração do m. transverso

 

A tensão da fáscia tóraco-lombar  auxilia no controle da movimentação inter segmentar  ao produzir tensão lateral para restringir o movimento intervertebral lombar (8) (9).

em experiências com porcos verificou-se que aumentar a tensão da camada intermediária da fáscia toraco-lombar sem aumento da pressão intra-abdominal não havia nenhum efeito significativo de contração paravertebral. E quando as inserções fasciais foram cortadas, o aumento da pressão intra-abdominal diminuiu a rigidez da coluna em direções especificas de movimento (9).

 

Estabilidade pélvica

Fig 13 (Hodges)

A forma em cunha do osso sacro entre os ilíacos dá à articulação sacro ilíaca uma direção obliqua no espaço. Em um plano horizontal de trás para frente de dentro para fora. A inserção dos transversos abdominais e oblíquo interno na crista ilíaca faz com que a contração deles traciona a porção anterior dos ilíacos em direção à linha alba o que  imprime uma força de compressão sobre a parte anterior dessa articulação. Os ligamentos sacro-ilíacos rígidos contrabalançam a força anterior. Devido à diferença de comprimento do braço de alavanca do músculo transverso abdominal e a força do ligamento a força de reação destes deve ser quatro vezes maior que a força do músculo. E o equilíbrio entre essas duas forças equilibrará a articulação sacro-ilíaca no plano horizontal estabilizando-a.

 

  1. Platzer W., Anatomie tome I Appareil Locomoteur 2eme édition, Paris, Flamarion Médecine-Sciences, 1982
  2. Rouvière H., Delmas A., Anatomie Humaine, 13ª edition, Paris, Masson , 1991
  3. Hodges P.W., Richardson C., Hides J., Fisioterapia para a estabilização lombopélvica. São Paulo: Phorte editora, 2011
  4. Netter F.H., Atlas de Anatomia Humana. Porto Alegre, 1996
  5. Kapandji I. A. Fisiologia Articullar vol. 3. São Paulo, Editora Manole, 1980
  6. Cresswell AG1Grundström HThorstensson A. Observations on intra-abdominal pressure and patterns of abdominal intra-muscular activity in man Acta Physiol Scand.1992 Apr;144(4):409-18.
  7. Gracovetsky et al 1977 A mathematical modelo f the lombar spine using na optimised system to control muscles and ligaments. Orthopedic CLinic of North America 8: 135-153
  8. Hodges P. W., Richardson C. A., 1997 Relationship between limb movement speed and associates contraction of the trunk muscles. Ergonomics 40:1220-1230
  9. Hodges et al 2003 Intervertebral stiffness of the spine in increased by evoqued contraction of transversus abdominais and the diaphagm: In vivo porcine studies. Spine, Spine (Phila Pa 1976). 2003 Dec 1;28(23):2594-601.

 

2 comentários sobre “TRANSVERSO DO ABDOME: ANATOMIA E FUNÇÃO

  1. Ângela, li sua revisão sobre os miltifidos e esta sobre o transverso.
    Percebo a atuação destes dois em equilíbrio p a manutenção da estabilidade lombar. Em equilíbrio mas favorecendo ações opostas, pois quando recrutamos o transverso, a tendência é retificarmos ou até cifosarmos a lombar e os multifidos levam p a extensão da mesma. Considerando essa ação concomitante de ambos acho muito interessante o trabalho em equipe destes músculos.

    • Perfeita sua observação, lembrando que é na ação concomitante de ambos que repousa a estabilização segmentar lombar.

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