TRANSMISSÃO DE FORÇA NO TECIDO MIOFASCIAL

Palestra realizada on line  por  Jan Wilke – Alemanha – no Congresso Fascia in Movement and Sports de 10 a 12 de dezembro de 2020 /  Organização Universidade da Fáscia

  1. Rolagem de espuma.

Pressão é uma força aplicada em uma determinada área. Apoiar o calcanhar em um prego será terrivelmente dolorido, mas o faquir pode deitar-se sobre uma quantidade de pregos e suportar porque a pressão de seu peso será distribuída em uma grande quantidade de pregos.

Utilizar um rolo de espuma no lugar de uma bolinha, por exemplo, já apresenta a vantagem inicial de oferecer uma área maior para apoio o que possibilita uma área maior sobre a qual distribuir o peso da região corporal a ser trabalhada. Se alguém sente muita dor ao apoiar-se no rolo, deveria mudar a forma de utilizá-lo, usando, por exemplo, mais de um rolo e aos poucos poderá sentir a massagem mais suportável.

Existem duas formas possíveis de deformação mecânica dos tecidos: Por compressão (força de cima para baixo) e por cisalhamento (movimento horizontal das camadas)

Técnicas e efeitos da aplicação da rolagem de espuma

a. Por compressão: quando só se apoia estaticamente um determinado local sobre o rolo

Essa técnica é eficiente para o tratamento de trigger points latentes (aqueles dolorosos à palpação, mas que não despertam uma dor conhecida) e para melhoria da rigidez pós treino.

b. Por rolamento: quando se desliza o rolo ao longo de uma superfície mais ou menos longa do corpo – esse é o trabalho mais usual.

Essa técnica melhora a perfusão sanguínea. Isso já foi comprovado através de exames de ultrassom. Portanto, deve seu útil na recuperação de tecidos pós trauma. Melhora também o deslizamento entre as fáscias:  Sob a pele temos o tecido adiposo, depois a fáscia superficial, depois uma mais profunda, na qual se encontram varias camadas. Já houve trabalho de pesquisa que mostrou aumento do deslizamento entre as diversas camadas fascias pós massagem com rolamento de espuma. Deve ser útil na recuperação da rigidez pós treino esportivo e na melhora da flexibilidade.

c. Por cisalhamento: quando se pressiona uma área, forma-se uma onda muscular junto ao rolo e mantendo-se a pressão se faz um movimento bem pequeno de vai e vem em uma pequena extensão. A onda que se desloca em um sentido estaria mobilizando as camadas mais superficiais e as camadas mais profundas são mobilizadas pelo deslizamento sob pressão que se exerce no sentido oposto.

O palestrante acredita que esse procedimento deve ser ainda mais eficiente na melhora do deslizamento das fáscias do que o rolamento, mas pesquisas ainda são necessárias para essa comprovação.

Forma de aplicação

a. A velocidade de aplicação não altera o efeito final.

b. Rolagem e alongamento podem ser ações combinadas

c. Existe também um efeito semelhante do lado oposto do corpo onde se aplica a técnica. Se o trabalho é feito em um membro inferior, o outro também se beneficia.

d. Timing É indiferente que o procedimento seja realizado antes ou depois do trabalho muscular.

  1. Como o rolamento de espuma pode modificar a transmissão de força?

Sabemos que a transmissão de força pode ocorrer a partir da contração de um músculo para o músculo vizinho pertencente à mesma cadeia a partir do tensionamento da fáscia do músculo vizinho que também entrará em contração e assim por diante. Mas como comprovar cientificamente essas transmissões?

O palestrante se referiu a dois experimentos que tentam responder essa questão.

a. Experimento 1:Ankle motion is associated with soft tissue displacement in the dorsal thight an in vivo investigation suggesting myofascial transmission across the knee joint. Front Physiol 2020 Mar 6;11:180

(Mobilização do tornozelo associado com deslocamento de tecidos moles na região dorsal da coxa- uma investigação in vivo que sugere transmissão de força miofascial através da articulação do joelho).

Experimentos em cadaveres demonstraram que há interação entre constituintes de uma cadeia miofascial . Jan Wilke e colaboradores realizaram uma das raras experiências publicadas na qual se evidencia essa transmissão in vivo.

11 indivíduos saudáveis (idade media 26,8+ou- 4,3 anos) foram colocados em decúbito ventral, joelhos em extensão, pés para fora da mesa de exame e submetidos a uma flexão dorsal passive de tornozelos com um dinamômetro isocinético, o que provocava um alongamento da musculatura da panturrilha. Um transdutor de ultrason de alta resolução foi colocado na região posterior da coxa para captar simultaneamente ao alongamento da panturrilha as imagens de deslocamento das fibras do músculo semimembranoso. Inatividade dos músculos do membro inferior era observada atraves de uma eletromiografia de superfície (um participante foi excluído devido a atividade eletromiografica captada durante o experimento).

Resultado: A flexão dorsal do tornozelo induziu um deslocamento caudal importante das fibras do músculo semimembranoso quando do alongamento passivo do tríceps sural. Isso demonstra in vivo transmissão de forças entre músculos conectados em uma mesma cadeia, o que significa que alterações das propriedades mecânicas do tecido pode modificar a flexibilidade das articulações vizinhas a ele.

Por essa razão é que corredores, jogadores de futebol, etc que apresentam dor na fáscia plantar não apresentam inflamação local, mas apresentam rigidez da panturrilha. O tratamento dessa retração pode resultar em melhora da dor plantar. Jogadores de futebol por vezes apresentam dores no abdomen inferior associadas a lesões de adutores. (Lembrar que na sínfise púbica existem prolongamentos miofascias de músculso oblíquos externos abdominais, reto interno da coxa e adutor médio). Assim, ao tratar afecções da região  ambos os grupos musculares devem ser tratados – rolagem de espuma, alongamento, etc

b. Experimento 2:Gathering hints for myofascial Force transmission under in vivo conditions: are remote exercices effects age dependente? Jan Wilke , kristin kalo, Daniel Niederer 2018.J Sport Rehabil 2019 Sep 1:28(7):758-763

(Coletando informações sobre transmissão de força miofascial in vivo: os efeitos de exrcícios á distância são dependents da didade?)

Jan wilke e colaboradores realizaram esse experimento que me remeteu à vivências dos anos setenta. Para esse trabalho ele reuniu 168 participantes com idade média de 45 anos, dos quais 85 do sexo masculino. Seu objetivo era verificar se efeitos sobre um segmento corporal de exercícios realizados à distância desse segmento poderia variar com a idade. Por exemplo, a auto-liberação miofascial na fáscia plantar (feita massageando a região com bolinha de golfe) aumenta a extensibilidade dos isquiotibiais provavelmente devido a uma transmissão mecânica de forças através da cadeia miofascial. No entanto, na medida em que a continuidade estrutural dessas cadeias diminui com a idade a amplitude desse efeito provavelmente também diminui.

Então o objetivo desse trabalho era verificar a dependência da faixa etária nos efeitos da auto-liberação da fáscia plantar. Chamou-me a atenção o fato de que ele já parte do principio de que essa auto massagem libera os isquiotibiais. Então, provavelmente já foram feitos trabalhos prévios que comprovam esse fato. Efetivamente já foram sim. Pesquisei e achei alguns:

 Logicamente esse trabalho me fez lembrar do procedimento de antiginástica que li pela primeira vez no livro de Thérèse Bertherat publicado no final dos anos setenta, quando um dos primeiros procedimentos por ela descritos era a massagem da planta dos pés com uma bolinha de tênis, seguida sempre de um aumento da amplitude do teste de inclinação anterior do tronco levando dedos da mão na direção dos artelhos. Era efeito surpreendente, sem que na época entendêssemos muito bem o que se passava.

Atualmente isso é explicado através destes experimentos publicados nos últimos cinco ou seis anos. O palestrante já partiu da admissão desse fato para agora verificar se esse aumento de flexibilidade pode ser mais modesto com a idade.

Ele realizou um teste de extensibilidade simples: o individuo sentava-se no chão com tornozelos a 90º e plantas dos pés apoiadas nos pés de um banco sobre o qual ele deslizava as mãos. A ponta dos dedos da mão atingiam um limite a partir do bordo do banco que era devidamente medida. Em seguida realizava massagem da planta dos pés com bolinha de golfe (imagino que o peso a ser descarregado sobre ela não deva ser muito grande, sendo ela muito rígida). Em seguida realizava o mesmo teste novamente. O aumento de extensibilidade dos isquiotibiais foi de cerca de 10%. 58,9% dos participantes conseguiram um aumento de flexibilidade relevante. Quanto a importância da idade (que nesse experimento era o objetivo) parece que ela desempenha um pequeno papel.

Na conclusão ele sugere trabalhos futuros nos quais se pesquise além da transmissão mecânica de força, possíveis adaptações corticais que poderiam também desempenhar algum papel nesse aumento de flexibilidade.

RESUMO:

  1. Rolagem de rolo de espuma aumenta amplitude de movimento – e é tão eficiente quanto alongamento.
  2. Não há maiores alterações no desempenho motor. Bom para aquecimento.
  3. Melhora a recuperação (por exemplo, no dolorimento) – o que deve ter a ver com efeitos sensoriais
  4. Possíveis efeitos em tecidos locais e no Sistema Nervoso Central
  5. Diferentes técnicas precisam ser aplicadas concomitantemente à rolagem de espuma
  6. A rolagem de espuma pode ser aplicado baseada nas cadeias miofasciais.

Um comentário sobre “TRANSMISSÃO DE FORÇA NO TECIDO MIOFASCIAL

  1. Maravilha! Quantos movimentos como da antiginastica, GH são feitos sem terem feitos experimentos…
    Mas será que tudo precisa ser comprovado?
    Mas que é interessante é.

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