Ao considerar as situações estática e dinâmica vertebrais, a fisiologia osteopática define três diferentes situações que denomina easy flexion, desabitação e imbricação para explicar os movimentos vertebrais (1).
Em um equilíbrio estático a vértebra repousa sobre o núcleo. Apesar da face inferior do corpo vertebral estar em contato com todo o anel fibroso, o núcleo pulposo no centro encontra-se em expansão e tende a afastar as superfícies dos corpos vertebrais. As superfícies articulares das articulações intervertebrais estão frente a frente sem se tocar. É como se a vértebra flutuasse e qualquer movimento pode iniciar a partir dessa posição. Diz-se, então, que a vértebra encontra-se em easy flexion. No entanto, essa não é uma posição fixa, a easy flexion comporta uma amplitude de movimento na qual as apófises articulares estão livres, não se tocam, a vértebra ocntinua ocmo que em um estado de “flutuação”.
SEGMENTO VERTEBRAL EM EASY FLEXION
Em um equilíbrio dinâmico, isto é, durante movimentos mais amplos, as facetas articulares da vértebra superior deslizam sobre a inferior. Em uma anteflexão as facetas articulares da vértebra superior deslizam para cima, em desabitação, até o limite do movimento. Este é causado pela tensão capsulo-ligamentar, pelo ligamento longitudinal posterior e sobretudo pelos ligamentos interespinhais e supraespinhal. Na póstero-flexão as facetas articulares escorregam para baixo, em imbricação, até o limite do movimento causado pelas tensões capsulo-ligamentares, pelo ligamento longitudinal anterior e pelo encontro entre os processos espinhosos (1, 2).
SEGMENTO VERTEBRAL EM IMBRICAÇÃO E EM DESABITAÇÃO
As superfícies articulares deslizam lateralmente nas rotações.
Se a easy flexion comporta certo número de graus de movimento, dentro de uma amplitude que permita às superfícies articulares permanecerem face a face sem se tocar, qual seria a posição na qual a vértebra passaria de easy flexion para imbricação ou desabitação? Não encontrei definições precisas para esse ponto dentro da amplitude de movimento.
Com o clássico estudo de Panjabi (3), encontramos a definição de uma nova situação que, creio, pode preencher essa lacuna ao introduzir um novo conceito – o de zona neutra. Nesse estudo os experimentos foram realizados in vitro.
Em laboratório uma coluna foi carregada com a máxima carga fisiológica estimada (não explica como essa estimativa foi calculada) em cada um dos possíveis sentidos de movimento. Ao se retirar a carga a coluna não retornava à posição inicial, mantendo sempre um alongamento residual. Isso era realizado três vezes. Após a segunda carga aguardava-se 30 segundos, anotava-se a posição, aplicava-se uma terceira carga e anotava-se a posição atingida com ela. Portanto eram anotadas a posição depois da segunda carga e aquela atingida na terceira carga. Então, o processo era repetido no sentido oposto. O deslocamento residual presente em um sentido e em outro antes do inicio da terceira carga definia os limites do que se denomina zona neutra. A posição neutra é definida como o ponto médio da zona neutra. A zona elástica é definida em cada sentido pela amplitude de movimento observada durante a terceira carga. A amplitude de movimento em cada sentido é a soma da zona neutra e da zona elástica.
Posição neutra:
A posição da coluna na qual todas as tensões internas raquidianas e o esforço muscular para a manutenção da postura são mínimos. É o ponto intermediário da zona neutra.
Zona neutra (ZN):
Aquela compreendida entre a posição articular depois da segunda carga exercida em um sentido do movimento e no outro. Nela o movimento raquidiano ocorre com mínima resistência interna. É zona de alta flexibilidade ou frouxidão.
Zona Elástica (ZE)
Parte do movimento fisiológico intervertebral medido a partir do final da zona neutra até o limite fisiológico que é obtido com significativa resistência interna. É a região na qual a mobilidade é produzida contra uma resistência interna significativa.
Amplitude de movimento (AM)
A amplitude total do movimento fisiológico intervertebral é medido a partir da posição neutra. É composta pela soma da zona neutra e da zona elástica.
Percentagem da Zona neutra
A soma da amplitude da zona neutra e da zona elástica corresponde à amplitude de movimento.
Porcentagem da zona neutra é um parâmetro interessante para se comparar diferentes situações.
%ZN=ZN/AM x100
GRAFICO PUBLICADO NO ARTIGO CITADO DE PANJABI
Zona neutra e estabilidade vertebral
Vários experimentos confirmam que a zona neutra é um parâmetro mais sensível que a amplitude de movimento na caracterização de instabilidade vertebral.
Para a estabilidade vertebral concorrem um sistema passivo, um ativo e um neural. O passivo compreende estruturas ósseas e ligamentos vertebrais. Atuam em especial nas zonas elásticas. O ativo compreende a capacidade muscular de gerar força, o que possibilita estabilização do segmento vertebral. Ele é especialmente importante na estabilização na zona neutra. Ambos os sistemas, em especial o muscular, dependem da eficiência do sistema nervoso.
Panjabi sustenta que os três sistemas são interdependentes na estabilização vertebral. Um é capaz de compensar as deficiências do outro.
Em termos biomecânicos a lombalgia pode ocorrer como consequência de déficits no controle segmentar da coluna quando, de maneira anormal grandes movimentações segmentares provocam compressão e estiramento nas estruturas neurais ou deformação incomum nos ligamentos e estruturas sensíveis à dor (4).
- Bienfait, M. Fisiologia da Terapia Manual . Trad. Angela Santos, São Paulo Summus, 2000
- Ricard, F. Sallé, J-L. Osteopatia Teorico e Prática. São Paulo Robel Editorial, 1996
- Panjabi, M.N. The stabilizing system of the spine. Part II Neutral zone and instability hypothesis Journal or spinal disorders Vol. 5, n.4, pp 390-397 1992 Raven Press, Ltd., New York
- Richardson C., Hodges P. W. , Hides J. Fisioterapia para a estabilização lombopelvica 2ª ed. Phote editora São Paulo, 2011