NOVAS ABORDAGENS SOBRE FUNÇÃO MUSCULAR

 

REFLEXÕES BASEADAS NA LEITURA DE  KINETIC CONTROL DE MARK COMERFORD E SARAH MOTTRAM

 

Encontrei nesse texto novas abordagens sobre as funções musculares. Os conceitos de músculo estático e dinâmico parece ampliado. Vamos a eles.

 Músculos estabilizadores e mobilizadores

 Comerford e Mottram consideram que todos os músculos têm quatro funções principais:

  1. Encurtar concentricamente para produzir amplitude e aceleração de movimento – função de mobilidade.
  2. Manter isometricamente uma posição – função de controle postural
  3. Alongar excentricamente sob tensão para desacelerar movimento e controlar amplitude excessiva – função de estabilização
  4. Prover feedback proprioceptivo aferente para o SNC com finalidade de regular e coordenar a rigidez e tensão musculares.

Apesar de todos terem as quatro funções, alguns têm uma estrutura mais adequada para uma ou outra dessas funções.

Aqueles cuja estrutura possibilita um melhor desempenho para mobilidade seriam os dinâmicos?

Aqueles mais aptos a controle postural e de estabilização seriam os estáticos?

No texto essas considerações evoluem de forma a ampliar esse raciocínio inicial estático/dinâmico.

 

Características dos estabilizadores

Monoarticular

Profundo (pequena alavanca, baixo torque)

Inserções aponeuróticas amplas (para melhor distribuição e absorção de força e carga)

Alavancagem para manutenção de carga, suporte estático e compressão articular

Manutenção postural associada com momento de desaceleração excêntrica ou resistência (em especial no plano axial- rotação)

Ex. Oblíquo externo/oblíquo interno (encontrei-os como exemplo pg. 24 table 2.1, mas sem que se justifique o fato de não serem mono articulares e terem outras características de dinâmicos!) , semiespinhais (imagino que os mono articulares apenas – rotador curto), glúteo máximo profundo, subescapular

 

Características dos mobilizadores

Bi ou poli articulares

Alavanca mais longa e torque maior

Massa muscular maior

Fibras unidirecionais ou inserções tendinosas (para dirigir a força que produz movimento)

Alavancagem para amplitude e velocidade

Movimentos rápidos e repetitivos de muita força, tensão e carga.

Ex. Reto femoral, Peitoral maior, Elevador da escápula, Reto abdominal.

Músculos globais e locais

Bergmark(1) desenvolveu em 1989 um modelo para a descrição do controle muscular de transferência de carga através da coluna lombar. Introduziu o conceito de sistemas musculares local e global envolvidos no equilíbrio lombar. O sistema local consiste de músculos com inserção ou origem (ou ambas) nas vértebras lombares enquanto o sistema global consiste de músculos com origem na pelve e inserções na caixa torácica. Devido à postura da coluna lombar, a distribuição de força no sistema local parece independente das cargas externas ao corpo (embora a magnitude de força é, claro, dependente da magnitude de carga). Por outro lado, distribuições diversas de cargas externas sobre o corpo encontram diferentes distribuições de forças no sistema global. Grosso modo, o sistema global parece cuidar de diferentes distribuições de forças externas e o sistema local realiza uma ação essencialmente determinada no local (pela postura da coluna lombar)

Mobilizador-Estabilizador / Local-Global

Comerford e Mottram em 2001 reuniram os conceitos de sistema muscular local/ global com o conceito de sistema muscular estabilizador/mobilizador (2) e ampliaram a aplicação desse conceito para outras regiões corporais.

Consideram que todos os músculos são capazes de produzir ajustes antecipatórios ou simultâneos, todos podem reagir reflexamente em trabalho muscular de recrutamento de alto ou baixo limiar e demonstram recrutamento antecipatório se apropriado. Mas apenas os músculos de estabilidade local exibem disparos antecipatórios independente da direção, da carga ou deslocamento do movimento.

Classificam os músculos em:

Músculos de estabilidade local

Músculos de estabilidade global

Músculos de mobilidade global

Músculos de estabilidade local

Funções e características: Aumento da rigidez muscular, controle segmentar do movimento/translação, controle da posição articular neutra, contração sem ou com mínima alteração de comprimento, não produz amplitude de movimento, frequente atividade antecipatória ou simultânea, recrutamento não antecipatório se o músculo já estiver ativo, atividade muscular independente da direção de movimento, atividade contínua ao longo de todo o movimento, função de propriocepção informando posição, amplitude e grau de movimento.

Disfunção: Deficiência de controle motor se associa a atraso de disparo ou deficiência de recrutamento, reage a dor e patologia com inibição, diminuição da rigidez muscular e controle segmentar insuficiente, perda de controle da posição articular neutra.

Músculos de estabilidade global

Funções e características: gera força para controlar amplitude de movimento, pela contração excêntrica altera o comprimento ao longo de toda a amplitude de movimento, habilidade funcional para encurtar em posição mais curta que a de repouso, mantem posição em isometria, controla excentricamente o retorno contra a gravidade e controla a amplitude além da posição de repouso de uma articulação hiper-móvel, desacelera momento de força de baixa carga (em especial no plano horizontal – rotação),  atividade não contínua, atividade muscular dependente da  direção e influenciado por músculos antagonistas, ativação de alto limiar em situações de carga e velocidade

Disfunção: Perde a habilidade de encurtar durante a amplitude mais encurtada que a de repouso, manutenção insatisfatória da posição em contração isométrica, não controla de forma excêntrica o retorno adequadamente, recrutamento ineficiente em baixa carga, dissociação de rotação ruim, se houver hiper-mobilidade o controle de amplitude excessiva é ineficiente, inibição pelos antagonistas dominantes, recrutamento alterado dos padrões e movimento não controlado com recrutamento em altos limiares, déficit de força em recrutamento de alto limiar.

Músculos de mobilidade global

Função e características: Torque para amplitude de movimento articular, contração com alteração concêntrica de comprimento – e não controle excêntrico, aceleração concêntrica de movimento em especial sagital- flexo-extensão, absorção de choque de altas cargas, atividade muscular dependente da direção, atividade muscular intermitente.

Disfunção: Perda da extensibilidade miofascial, consequentes limites fisiológicos e/ou movimentos acessórias a serem compensados em outro local, hiperatividade em baixos limiares, recrutamento em baixa carga, reação à dor e patologia com espasmo, demonstra movimento sagital não controlado quando em testes de recrutamento de alto limiar. 

Exemplos

Somente a análise de quatro características poderia trazer uma análise crítica dos papéis até aqui atribuídos a cada músculo:

  1. A inter-relação entre anatomia muscular e histologia,
  2. seu potencial biomecânico,
  3. sua fisiologia de recrutamento,
  4. as alterações que sofre frente a dor e patologia

Infelizmente tal análise é disponível apenas para um limitado numero de músculos tais como reto abdominal, isquiotibiais, oblíquo abdominal externo e transverso abdominal.

Estabilizadores locais:

Músculos com braço de alavanca tão pequeno que produz mínimo movimento ou movimento algum ao contrair-se. Controla em especial a translação inter segmentar como por exemplo os mono-articulares do grupo transverso espinhal (rotadores curtos), inter-transversos. Outros exemplos: músculo transverso abdominal, vasto medial oblíquo, fibras longitudinais do músculo longo do pescoço.

Estabilizadores globais:

Músculos mono-articulares pouco maiores ainda com braços de alavanca curtos são mais eficientes em controlar excesso de movimento durante alongamento excêntrico como, por exemplo, o músculo subescapular, músculo ilíaco, músculo abdominal oblíquo externo.

Mobilizadores globais:

Reto femoral e isquiotibiais, com longos braços de alavanca e bi articulares, possuem grande amplitude de movimento e têm vantagem biomecânica para tal função durante um encurtamento concêntrico. Outros exemplos, músculo reto abdominal, iliocostal lombar.

Músculos multifuncionais: Assoalho pélvico, glúteo máximo, infraespinhal.

Músculos para vertebrais são em principio citados como estáticos. Ao estudar a anatomia local fica claro a presença de dois tratos, um mais profundo e outro mais superficial. O profundo, com maioria de músculos mono-articulares e alguns poliarticulares, parecem ter uma função mais estática – seriam aqueles aqui considerados estabilizadores locais; enquanto o trato superficial de músculos essencialmente poliarticulares que reúnem vértebras, costelas e osso ilíaco parecem ter caráter mais dinâmico – mobilizadores globais,  que  possibilitam o retorno de uma coluna enrolada pra frente, mas também me parece que poderiam ser estabilizadores globais ao controlar o movimento de inclinação para frente do tronco. Seguindo o que esses autores preconizam como patologia para esses músculos, se houver disfunção dos estabilizadores locais profundos eles se inibem, não enrijecem, como até aqui imaginei. Os superficiais é que compensariam a disfunção dos profundos se retraindo, se enrijecendo. Os transversos espinhais, os interespinhais estariam mais silenciosos que os iliocostais ou os longos do tórax.

O mesmo se pode dizer dos isquiotibiais citados como músculos globais. Parece-me que poderiam ser estabilizadores globais, ao se contrair para controlar a inclinação do tronco para frente, ou mobilizadores globais ao promover flexão do joelho em cadeia aberta ou extensão em cadeia fechada. Entram facilmente em retração (o que me fez sempre considera-los estáticos). Segundo raciocínio desses autores isso se explica por compensarem a inibição de um estabilizador lombar ou pélvico, que poderia ser causada por um posicionamento postural longamente mantido em posição sentada prolongada, (VER POST SOBRE DEFINIÇÃO DE MOVIMENTO NÃO CONTROLADO),  que inibiria os controladores lombares e pélvicos e resultaria em hipertensão  dos estabilizadores locais e encurtamento posicional dos músculos mobilizadores pouco utilizados ou não alongados, como seria o caso dos isquiotibiais. Sua retração garantiria a estabilização do segmento lombopévico em inclinação anterior, mas resulta em diminuição de amplitude de flexão da coxofemoral.

Generalizando: Falha no sistema local resulta em super-ativação do sistema global fazendo os músculos superficiais renunciarem a seu papel no movimento para garantirem a estabilização profunda (3).

REFERENCIAS:

  • Bergmark A Acta Orthop Scand Suppl.1989;230:1-54.Stability of the lumbar spine. A study in mechanical engineering.
  • Comerford, M.J., Mottram, S.L., 2001 Movement and Stability dysfunction – contemporary developments Manual Therapy 6, 15-26
  • Umphred, D. A.: 2007. Neurological Rehabilitation. 5th ed. Mosby Elsevier, St. Louis, MO. Citado em Corrective exercises solutions . 1th ed. Lotus Publishing, England 2012

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