IIICBE: ELUCIDANDO ASPECTOS TERAPÊUTICOS DO TRATAMENTO DA ESCOLIOSE

III CONGRESSO BRASILEIRO DE ESCOLIOSE

Palestra de

René Castelein MD. PhD.

Professor do departamento de Ortopedia e Cirurgia

Centro holandês de escoliose

Centro médico universitário Utrecht, Holanda

 

Escoliose é um problema biomecânico

Ao contrário do que ocorre nos animais quadrúpedes, nos humanos todas as forças agem mais ou menos alinhadas axialmente.  Tais forças que atuam cronicamente sobre a coluna humana são devidas à gravidade, ação muscular e crescimento; todas na mesma direção e plano.

Isso torna a biomecânica humana um pouco diversa quando comparada a outros vertebrados.  Somos semelhantes, mas um pouco mais eretos.

Alongamento anterior ou RASO (Relative anterior spine overgrowth)

Em estudo comparativo de imagem de ressonância magnética (MRI) entre um grupo de adolescentes portadores de escoliose idiopática (EI) e outro de indivíduos normais, investigou-se o crescimento dos elementos anteriores em relação aos elementos posteriores da vértebra.

J Bone Joint Surg Br 2003 Sep;85(7):1026-31. doi: 10.1302/0301 620x.85b7.14046. Relative anterior spinal overgrowth in adolescent idiopathic scoliosis. Results of disproportionate endochondral-membranous bone growth  X Guo – WW Chau, YL Chan JCY Cheng

Estudos prévios sugeriam que um crescimento desproporcional entre elementos anteriores e posteriores da coluna poderia contribuir para o desenvolvimento da EI. No trabalho acima citado, imagens de 83 meninas foram examinadas (idade entre 12 e 14 anos, Cobb entre 20 e 90 graus).

Várias medidas foram feitas em cada vértebra torácica, nos melhores cortes sagitais e axiais das ressonâncias magnéticas. Comparando-se com o grupo controle, nas colunas escolióticas verificou-se corpos vertebrais mais longos entre T1 e T12 na coluna anterior e pedículos menores, com distância interpedicular maior na coluna posterior.

A diferença entre o comprimento anterior da coluna nos portadores de escoliose o os não portadores era significante (p < 0.01). Também era significativa a correlação entre a severidade do grau da escoliose e o crescimento diferenciado entre região anterior e posterior da coluna em cada vértebra torácica (p < 0.01).

Em comparação com o grupo controle o crescimento longitudinal dos corpos vertebrais em pacientes com EI, é desproporcional e mais rápido, ocorrendo sobretudo por ossificação endocondral. Ao contrário, o crescimento circunferencial por ossificação membranosa é mais lenta nos corpos e pedículos vertebrais.

Estas relações existem, mas Dr Castelein acredita que uma não leva à outra. O aquecimento global aumentou a venda de sorvete, mas não o contrário.  Quando vemos duas coisas ocorrendo ao mesmo tempo, temos que saber o que veio antes.  Para tanto, temos que responder algumas questões:

Onde a deformidade está localizada?

Precisa estar localizada no osso, já que os discos crescem de forma mais passiva?

Seria o crescimento anterior excessivo exclusivo da escoliose idiopática?

Onde está localizada a deformidade em 3D? No disco? No corpo?

Crescimento anterior excessivo seria primário e a rotação axial secundária?

Vários estudos foram feitos para esclarecer este assunto.

Este é um deles feito com colegas suecos do palestrante:

Anterior spine overgrowth is the result of the scoliotic mechanism and is locates in the disc.   https://journals.lww.com/spinejournal/Abstract/2017/06010/Anterior_Spinal_Overgrowth_Is_the_Result_of_the.7.aspx

A base de dados utilizada foi de pacientes portadores de escoliose idiopática e escolioses neuromusculares. Todos com ressonância magnética.

Cada vértebra foi segmentada em diferentes parâmetros de forma  a permitir medidas exatas em todos eles. Também foram medias as alturas dos discos. Para cada vértebra havia um acunhamento coronal, mas também uma assimetria anterior e posterior. A torção também foi analisada. A escoliose ficava mais longa nos casos neuro musculares.

Ao analisarem o grupo controle sem escoliose, viram que a coluna anterior é 3% mais curta que a posterior. Na coluna com escoliose idiopática, a coluna anterior na área torácica é maior cerca de 1,2% do que a coluna posterior. Na escoliose neuromuscular ocorre aproximadamente o mesmo, a coluna anterior é 0,9%maior que a posterior.

Ao analisarem o formato da vértebra no grupo controle sem escoliose, elas são menores anteriormente 3,4%, portanto encontram-se em cifose. No grupo de escoliose idiopática, por mais que a coluna torácica esteja em lordose, as vértebras continuam em cifose, assim como nas neuromusculares. A diferença é somente no disco.

O disco no grupo de controle era menor anteriormente (1,5% ),  no grupo de idiopáticas era maior (17,5%) e no grupo neuromuscular  era  também maior (19,1%.)

Curvas compensatórias que ocorrem associadas a uma escoliose estruturada congênita também foram estudadas .  Viram que casos com curva torácica superior alta, devido à má formação óssea, desenvolviam curvas compensatórias abaixo e podiam evoluir como uma idiopática, tornando-se com o tempo  severa e estruturada, com a mesma característica de maior comprimento anterior.

Foi apresentada imagem de  quatro  esquemas representando o plano sagital de colunas do grupo controle, de curvas escolióticas idiopáticas, neuromusculares e compensatórias de escolioses congênitas. Na coluna normal a parte anterior é mais curta. Nas escolioses idiopática, neuromuscular e na curva compensatória das congênitas a parte anterior é mais longa.

Assim, o grupo de controle está em cifose, ou seja, tem uma coluna anterior mais curta e todos os tipos de curva escoliótica tem uma região anterior mais longa. Os ossos em todos os tipos estão em cifose (altura do corpo anterior menor que a altura do corpo posterior), mas nos casos de escoliose os discos estão em lordose muito severa. Assim, concluímos que este comprimento extra anterior existe, mas não é parte da patologia da escoliose idiopática porque o vemos em tipos diferentes de escoliose. Também não se trata de um problema de crescimento ósseo porque o formato do osso é similar em todos os tipos de escoliose, se comparado ao grupo controle. O problema, então, está no disco. E não se conhece nenhum mecanismo que possa fazer o disco crescer mais anteriormente. Temos um mecanismo através do qual podemos tirar o peso da coluna anterior, só isso.

E aí surgiu a baleia

Na universidade onde o prof. Castelein trabalha há um departamento veterinário muito importante para onde todas as baleias que encalham nas praias holandesas são enviadas a fim de serem submetidas a exames que possam esclarecer porque encalharam. Um dia chegou  uma baleia  com escoliose.  O professor foi convocado. Para ele foi uma imensa surpresa, até então estava seguro de que escoliose só é possível entre humanos.  Quando a coluna do animal foi aberta verificou-se haver uma lesão severa na coluna, o que causou uma escoliose traumática, provavelmente ela colidiu com um barco, o que levou a várias fraturas. Os ossos analisados demonstraram um deslocamento da placa superior da vértebra e outras lesões. Portanto, tratava-se de uma lesão severa que levou a uma curva primária. Isso foi a causa da morte, mas ela não morreu de imediato, ainda nadou para alimentar-se e criou uma curva compensatória na área normal da coluna. Além disso, foi notado que havia sangue ao longo da medula. Fizeram uma análise 3D dessa curva compensatória, com as mesmas medidas e segmentações feitas em outros estudos. Descobriram que os corpos vertebrais estavam basicamente alinhados, não estavam deslocados. Os discos, que foram as estruturas que causaram a rotação, criaram uma lordose. A curva compensatória também foi uma lordose por rotação, muito maior anterior do que posteriormente. Não é uma situação normal, porque na baleia os elementos posteriores são sempre mais longos, o animal inteiro está em cifose. Tudo parecido com o que vemos na curva compensatória da escoliose congênita e parecido com que ocorre na escoliose idiopática, visto não ser esta uma escoliose associada a anormalidades anatômicas.

Conclusões:

  1. Nos grupos analisados, a coluna vertebral no grupo controle tem um comprimento anterior menor e em todos os tipos de escoliose há um comprimento anterior maior e não era no osso, mas no disco. Isso significa que não é um crescimento ativo, significa que não tem nada a ver em como a escoliose idiopática se inicia. O fenômeno está presente, mas não é a causa da escoliose.
  2. Deformidade é maior no disco em todas as regiões da coluna e em todos os planos
  3. Normalmente as pessoas pensam que o que precisa ser corrigido na escoliose são os ossos. O tratamento com colete, a amarração próximo ao corpo vertebral para fazer o realinhamento da escoliose para reduzir o crescimento na convexidade ( algo que está se tornando muito popular) têm o objetivo de a agir sobre o osso. O corpo vertebral na escoliose muda um pouco seu formato, mas o formato ósseo não é o que causa a escoliose, a deformidade em todos os planos é causada pelo disco. Dr Castelein afirma ter confirmado isso nos estudos realizados no campo cirúrgico.  Mesmo em escolioses acima de 50º a deformidade está muito mais no disco do que no osso.
  4. RASO (Relative anterior spine overgrowth) ou crescimento anterior,  não é um crescimento ativo, é uma expansão passiva do disco.  Não é exclusivo da escoliose idiopática e não é sua causa.  Uma vez a coluna descompensada, a morfologia 3D é muito semelhante, seja qual for a razão da escoliose (mesmo em uma baleia). Parece ser um mecanismo universal de como a coluna reage a um distúrbio do equilíbrio. A baleia nunca desenvolveria aquela deformidade e ela o fez porque seu equilíbrio foi perturbado e ela reagiu com a mesma resposta que vemos em outros tipos de escoliose, em especial nas idiopáticas. Lembrar que é muito mais fácil perturbar o equilíbrio da coluna humana do que qualquer outra na natureza.

 

A essência da escoliose é a rotação

A essência da escoliose já foi considerada como sendo o deslocamento lateral ou a extensão torácica. Para Dr. Castelein é a rotação.

Mostrou durante a palestra um raio X raro de um colega de Genebra, tirado antes do início de uma escoliose. Normalmente raios X prévios ao aparecimento da deformidade não existem.  Este colega tirou esse raio X por outra razão qualquer, onde nada de significativo foi visto, exceto uma ligeira rotação entre duas vértebras torácicas. Pela posição dos pedículos vemos que há uma ligeira rotação na região. Meses depois a cliente voltou já com sinais de uma escoliose, confirmada em um  Raio X que também foi apresentado, e ainda há um terceiro raio X com uma curva ainda mais importante feito algum tempo depois. Essa série de imagens demonstra uma assimetria inicial em rotação. Isso não é comprovado inequivocamente ainda, mas para ele tudo indica que rotação é essencial. Ao tratarmos devemos pensar em reduzir a rotação. Ao fazermos isso, há consequência positiva nos outros planos.

Muitos autores franceses já intuíam isso. Ele apresentou uma imagem nomeando :

Ambroise Paré (1550)

Levacher de la Feutrie (1772)

Magny (1780)

Nicos Andry (1741)

Portanto, este conceito não é novo. Os franceses enfatizaram a importância da rotação durante muitos séculos e já sabiam como era a anatomia em 3D da escoliose. Quando queremos analisar a escoliose no RaioX  é difícil, por estarmos analisando a projeção de um volume em um plano. Ao analisar um cadáver, por exemplo, podemos ver nas três dimensões.

Jean Dubusset afirma que a rotação não é um efeito secundário, mas o que inicia a escoliose.

René Castelein demonstra que o crescimento assimétrico da vértebra em escolioses estruturais não é primário, mas secundário a um fenômeno de rotação axial. Os franceses já sabiam disso e não é diferente do que afirmava René Perdriolle.

Se rotação é o primeiro evento que ocorre numa escoliose, precisamos entender porque a coluna começa rodar e porque não é vista em nenhum outro animal vertebrado.

As forças nos humanos são todas em direção axial e a coluna está muito bem equipada para lidar com isso. As placas terminais são muito fortes e os discos aguentam muita pressão. Os elementos posteriores são capazes de evitar que o disco escorregue, a não ser que haja uma espondilolise. Por que então a coluna começa a rotacionar? Porque temos um alinhamento sagital único. Podemos achar que parecemos com animais não primatas, mas eles têm o centro de gravidade localizado à frente da pelve e o nosso é o único a localizar-se acima da pelve. Isso tem a ver com a evolução dela, que é diferente se comparada à de outros animais e mesmo a animais bípedes.

No trabalho citado a seguir:

Spine J 2017 Aug;17(8):1202-1206. doi: 10.1016/j.spinee.2017.03.016. Epub 2017Mar 22.                                           The odyssei of sagital pelvic morphology during human evolution  e perspective of different hominidae

Encontramos o seguinte:

Comparando-se o plano sagital em diferentes hominídeos, vemos que ao longo da evolução humana, a evolução de uma lordose entre o ísquio e o ilíaco, com o consequente aumento da incidência pélvica, permitiu para a deambulação uma posição endireitada de 1º a 27º nos primatas semelhantes a humanos para 22º a 33º nos primeiros hominídeos. Nas crianças humanas atuais os valores são de 19º a 39º e de 26º a 48º nos humanos adultos atuais.

A complexa dinâmica coluna-pelve-quadril origina-se na adaptação da pelve à locomoção em posição de endireitamento e ao desenvolvimento de lordose na coluna lombar durante a evolução humana. A combinação de uma posição corporal endireitada é energeticamente eficiente, com a habilidade de simultaneamente estender os joelhos

Assim apenas os humanos possuem:

  1. Lordose pélvica
  2. Lordose lombar
  3. Extensão simultânea de quadris e joelhos

Consequência: Centro de gravidade acima da pelve e não frente a ela.

Isso faz com que todas as forças ajam em direção axial no ser humano. A vértebra situa-se no centro dessas forças e para que ela se estabilize, necessita de equilíbrio. Isso altera toda a biomecânica. Aqui temos uma situação em que as forças estão agindo de forma axial. Se dividirmos essas forças vemos que a força axial existe, mas também existe uma força posterior. Esta força posterior faz nossa coluna única, por agir em certas regiões da coluna. Ela tem que ser contrabalanceada por uma força anterior, caso contrário, ela se desequilibra. Isso não acontece pela existência dos ligamentos, por exemplo.

Ao analisarmos as trabéculas ósseas podemos ver a direção das forças agindo sobre o segmento. Ao compararmos a estrutura de uma vértebra com carga anterior, como L5 por exemplo e L1 ou D12, que tem uma carga posterior, as trabéculas são muito diferentes.

Esquematizei uma imagem semelhante à que foi apresentada indicando o sentido de desequilíbrio de cada vértebra. Pela posição das torácicas superiores há tendência a escorregamento anterior. A estrutura das apófises articulares situadas no plano frontal favorece a estabilização. A vértebra superior ao deslizar para frente encontra a faceta articular da vértebra inferior que bloqueia o deslizamento.

As vértebras torácicas inferiores e as três primeiras lombares têm tendência de escorregamento posterior e isso é característico dos humanos. A posição frontal das articulares torácicas não protegerão do escorregamento e na região lombar, onde as facetas articulares estão em um plano sagital, isso é ainda mais facilitado.

L4 e L5 voltam a ter tendência a escorregamento anterior. Elas estão inclinadas para frente, mas são protegidas pela faceta articular de S1 que é frontal o que segura L5 e L4 deve estar protegida pelo sistema ligamentar especial que une L4, L5 e S1 em um bloco funcional.

Experimentos foram feitos em vertebrados onde ao aplicar-se forças anteriores as vértebras permaneciam estáveis. As facetas articulares travam, elas não rodam. Mas, ao se aplicar força posterior as facetas não funcionam mais muito bem e há uma instabilidade rotacional que se instala facilmente. Portanto, vértebras com tendência a escorregamento posterior têm problemas em permanecer estáveis, isso é, não é difícil fazê-las rodar.  Já em L5 é mais difícil ocorrer rotação. Ela é mais estável em termos rotacionais.

Todos humanos têm leve rotação vertebral

Experimento:

Residentes sem escoliose contribuíram para o seguinte estudo: foi realizada uma ressonância em pé, depois deitado e depois em posição quadrúpede. Todas as colunas aparecem um pouco rodadas e  evidenciou-se padrão rotacional mais evidente em posição ostostática que em posição quadrúpede ou de decúbito.

O conceito é muito simples. Há três forças que agem sobre a coluna que levam a três deformidades:

Força axial

Força anterior –  que todas as espécies vertebradas têm

Força posterior – que apenas os humanos possuem

Toda força pode resultar em deformidade, se ela for maior que o mecanismo de compensação.

Compressão axial que pode aumentar durante a fase de crescimento. Isso pode reduzir o desenvolvimento das placas de crescimento anterior, resultando em placas de crescimento irregulares, que denominamos moléstia de Scheuermann.

Sentido anterior – deslizamento ou cisalhamento anterior (que pode resultar até em fratura dos processos articulares – espondilolise).

Sentido posterior – deslizamento posterior que pode desequilibrar a vértebra, levando a um processo de desequilíbrio rotacional e escoliose.

As vértebras assinaladas no desenho acima com carga posterior são as instáveis. O problema é que não sabemos com certeza a forma sagital de uma criança em desenvolvimento. Como será o plano sagital de uma menina entrando na puberdade por volta dos 9 ou 10 anos de idade? Não há dados, porque não fazemos Raio X em crianças com colunas normais. Haveria uma postura que favoreceria mais ou menos o desequilíbrio posterior e que, portanto, resultaria em um maior perigo de desequilíbrio rotacional, causador de uma escoliose?

Sabemos mais ou menos como é a coluna de um adulto. Nada sabemos sobre uma coluna infantil.

Atualmente em Utrecht utilizam o  Scolioscan  – Spinal ultrasound para estudar a coluna de uma população normal. Ele é livre de irradiação e quem sabe com esse procedimento poderão em breve publicar alguns dados.

Há uma síndrome genética na qual há alta incidência de escoliose . Trata-se da 22 deletion syndrome ou DiGeorge Syndrome , na qual falta uma parte do cromossoma 22.

50 pacientes portadores dessa síndrome foram controlados antes do estirão de crescimento.

Idade média 10.7 +ou- 1.7 na inclusão

Seguimento médio 4.8 +ou- 1.6 anos

48% desenvolveram escoliose durante esse período.

Fiz um esquema do que foi apresentado nas imagens sagitais obtidas pelo Dr Castelein. Ele não entrou em detalhes sobre como traçam o triângulo que se vê , analisei a imagem e acho que o triângulo é obtido da seguinte forma:  traçou-se uma linha que vai do centro do corpo de L2 até o centro de T7. Baixou-se uma vertical a partir do centro de T7 e traçou-se uma perpendicular dessa linha ao centro de L2.

Uma imagem foi obtida com cada cliente (e o triângulo traçado) antes da puberdade, quando não havia escoliose. Os que apresentaram triângulo muito pequeno  (com pequeno ângulo na região de T7 e um triângulo alto e estreito, não desenvolveram escoliose, os com triângulo muito maior desenvolveram escoliose cerca de três ou quatro anos depois.

Esta foi uma observação interessante, mas devemos lembrar que nestes casos não se trata de escoliose idiopática, mas nessa população aprendemos que se há uma inclinação posterior maior há um risco maior de desenvolvimento de escoliose.

Por que maior frequência das escolioses em mulheres?

As colunas das meninas tem maior orientação posterior que os meninos. A biomecânica delas é diferente. Por que as curvas são diferentes? Porque o perfil sagital é diferente.

O trabalho publicado como “diferences in early sagital plane alignment between thoracic and lumbar scoliosis”

Mostra que as características sagitais da lombar ou torácica determinarão a localização da curva escoliótica.

Por que torácica direita e lombar esquerda?

Normalmente, sem escoliose, quando estamos parados, temos alguma tendência rotacional que é exatamente esta – torácica direita, lombar esquerda. Isso foi determinado em um estudo através de ressonância magnética em indivíduos normais.

Uma vez descompensada, a coluna seguirá o padrão básico.  A coluna torácica superior tende à esquerda, pouco mais abaixo tende para a direita e na lombar para a esquerda.

Este é o padrão que se vê na escoliose. Roda para a esquerda na torácica superior, para a direita na torácica média e para a esquerda na lombar.

O que provoca a tendência rotacional em indivíduos normais?

Possivelmente pela anatomia dos órgãos internos. Nos casos em que os indivíduos apresentam o coração do lado direito e fígado do lado esquerdo, ocorre o contrário do que vemos em indivíduos com anatomia normal.

No entanto, se desenvolvermos a escoliose muito cedo, a curva torácica vai para a esquerda. Isso foi verificado em ressonâncias feitas por vários motivos, não só para estes estudos. Isso demonstra que há mudança da rotação de base com o passar do tempo. Quando somos  pequenos o coração é mais central, depois muda para a esquerda. O fígado não é tão assimétrico e depois com o crescimento ele migra para a direita. Estas alterações determinam as tendências rotacionais nos indivíduos normais ao longo da vida.

O papel do disco

Para o dr. Castelein  o alvo do estudo da escoliose deve ser o disco.

Em uma escoliose induzida em um porco, podemos ver a situação de um disco dentro da curva com o núcleo se deslocando para um lado e uma hipertrofia se desenvolvendo deste lado. Pode-se imaginar que este núcleo nunca voltará de onde veio. Como corrigir? É muito difícil.

Em outra imagem se vê o núcleo dentro de uma curva escoliótica em humano. Nela se observa também o deslocamento do núcleo para um lado. Ao se tentar uma manobra de correção, o núcleo retornou um pouquinho para o meio , mas não completamente.

O disco não contribui tanto para o crescimento na criança pequena, ele não é tão alto quanto será no adulto.

Durante o estirão:

As dimensões do disco se alteram em um curto período de tempo

A carga sobre o disco aumenta rapidamente em todas as direções

Como o disco se adapta?

Em um indivíduo muito jovem, o disco é imaturo, na medida em que cresce, durante o estirão, (quando se pode ter até 10cm de crescimento em um ano), a pressão no disco se altera muito em pouco tempo e ele tem que adaptar-se a esta mudança.

Os braços de força aumentam em todas as direções.

Dr. Castelein acredita que em muitas crianças os discos se adaptam, assim como sua mecânica, a esse crescimento, mas em muitas ele permanece imaturo, não cresce tanto, o que aumenta a probabilidade de rotação.  Isso também tem a ver com a fixação do disco. Ele está preso à vértebra quando somos adultos, mas quando criança essa fixação ocorre na cartilagem, antes da maturação óssea do corpo vertebral, que é muito mais fácil de deformar.

Em uma série de raios X sagitais de controle de uma escoliose congênita, o palestrante mostra que a coluna abaixo da curva resultante da má formação  permaneceu reta durante cerca de seis anos. Depois, uma imagem de raio X posterior de controle se vê que o disco começou degenerar, fato evidenciado pelo início de um escorregamento de L1 para trás . A força sempre esteve ali. A coluna permaneceu reta até o disco não aguentar mais e então começar rodar.  O fenômeno mecânico pode ser semelhante à escoliose idiopática. Podemos considerar que o disco é basicamente um ligamento e ele mantem a coluna unida. Se ocorrer degeneração do disco, isso pode deslocar a vértebra e a coluna.

Isso é característico de uma escoliose no adulto que, portanto, se assemelha muito à escoliose idiopática. Em ambas ocorre:

– Instabilidade rotatória

– Equilíbrio entre cargas e rigidez discal perturbada

– Direção obedece o padrão rotacional

– O disco eventualmente estabiliza

-Desafio: como evitar a deformidade discal permanente?

CONCLUSÕES:

  • Há muita semelhança entre escoliose infantil e do adulto
  • Escoliose é um problema mecânico
  • O crescimento anterior não é exclusivo da escoliose idiopática
  • A coluna humana é rotacionalmente instável por conta do perfil sagital
  • A escoliose ocorre quando a maturação do disco não está em sincronia e não consegue acompanhar o crescimento corporal (isso ainda não foi provado mas é o que estão estudando)
  • A direção da rotação que se instala é determinada por uma rotação que já existe

 

DURANTE AS RESPOSTAS ÀS QUESTÕES QUE SE SEGUIRAM UM PONTO NÃO ABORDADO DURANTE A PALESTRA PARECE INPORTANTE DESTACAR

Alguém diz ter observado em clientes com ângulo de Cobb de aproximadamente 18º assimetrias do dorso semelhantes à do grupo controle normal. Pensou então que no passado alguém deve ter estipulado 10º de inclinação lateral como limite de normalidade e a partir de então seria considerado escoliose.  10º passou a ser o ângulo de corte. A pergunta foi se o Dr Castelein acredita ter chegado o momento de rever a forma como devemos diagnosticar a escoliose.

Ao que ele  respondeu:

“Creio que sim. A definição que temos como limite de corte pela SOSORT é de 10º e temos um grupo grande de clientes nos quais não há muitas anormalidades estruturais. Também sempre ouvimos relatos de casos que espontaneamente de auto-corrigem. Creio que se fossem portadores de uma escoliose verdadeira, isso não ocorreria. Mas a questão é o que é uma verdadeira escoliose?  Isso tem a ver com as alterações permanentes que ocorrem no disco.  Não acho ser um ciclo vicioso do crescimento ósseo. Deve ser um ciclo vicioso  na adaptação do disco. Além de um certo ponto o disco não consegue se regenerar e retornar ao normal. Isso continua e piora. Isso ocorreria aos 10º? Tenho dificuldades com essa teoria dos 10º também. Mas não conseguimos ver clinicamente uma curva de 10º. Algumas pessoas conseguem, mas normalmente não conseguimos.  No entanto,  se pudéssemos ver essa curva em uma criança, talvez essa já seja uma curva que venha a piorar com os anos. É difícil determinar o ponto de corte.

Creio, no entanto , que muitas curvas de 10, 15 ou 20 graus são benignas e diferentes de uma escoliose idiopática verdadeira, mas não conseguimos definir exatamente a diferença entre as duas. Escoliose é a continuidade de algo que se torna uma patologia. Mas não é fácil explicar porque pessoas diferentes tem escoliose.

 

 

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